quarta-feira, julho 22

Madrugada.

Um dia falaram:
- Sejam como maquinas.
E o descanso acabou.

São cinco da madrugada, faz frio, ele toma o famoso banho de gato e se enxuga no lençol da cama. Come pão dormido enquanto com maestria faz o nó do seu cadarço.
Bate a porta com força e corre até o ponto de ônibus.
Durante a espera, se põe a pensar...
Já não tem mais sonho algum, não se lembra mais de seu ultimo sorriso, pior, nem da sua ultima lagrima.
Não se lembra de um amigo, nem mesmo de um idiota que o provocou algum dia no passado.
É a manha de um domingo, o sol já apareceu.
Refletido na alça da sua mala, um botão no meio da testa.
On?
O ônibus está chegando.
O homem caminha até a pista.
Aponta o botão em direção ao ônibus.
Amém!

domingo, julho 12

Morte

A maioria das pessoas não está pronta para a morte, a sua ou a dos outros. Ela as choca, as apavora. È como uma grande surpresa. Diabos, não deveria ser nunca. Levo a morte em meu bolso esquerdo. Às vezes, tiro-a do bolso e falo com ela: “Oi, gata, como vai? Quando virá me buscar? Vou estar pronto.”
Não há nada a lamentar sobre a morte, assim como não há nada a lamentar sobre o crescimento de uma flor. O que é terrível não é a morte, mas as vidas que as pessoas levam ou não levam até a sua morte. Não reverenciam suas próprias vidas, mijam em suas vidas. As pessoas as cagam. Idiotas fodidos. Concentram-se demais em foder, cinema, dinheiro, família, foder. Suas mentes estão cheias de algodão. Engolem Deus sem pensar, engolem o país sem pensar. Esquecem logo como pensar, deixam que os outros pensem por elas. Seus cérebros estão entupidos de algodão. São feios, falam feio, caminham feio. Toque para elas a maior música de todos os tempos e elas não conseguem ouvi-la. A maioria das mortes das pessoas é uma empulhação. Não sobra nada para morrer.


- Bukowski

terça-feira, julho 7

Vou-me embora daqui.

- MEFISTÓFELES
Se tu, meu bom senhor, queres tanto me ver,
E por tudo perguntas que há lá pelo inferno,
E sempre a mim contemplas, com todo prazer,
Aqui me tens de novo humilde, caro e terno.
Perdoa se não uso alta e fina linguagem,
Às vais da assistência há muito tenho horror.
Minha “tara” a teus risos dará sempre margem,
Também caso não hajas perdido o teu humor.
Do sol e das estrelas eu nada compreendo,
Atormentar os homens é só o que entendo,
E o homem há de ser sempre um grande toleirão,
Como no dia primeiro em que houve a Criação.
Bem melhor viveria um ser que é tão franzino,
Não lhe tivesses dado o lampejo divino,
Que se chama Razão, o que o faz mais brutal
Do que todos os bichos do reino animal.
Ele mais me parece, e peço permissão,
Um gafanhoto vil de grande proporção,
Que sempre voa, voa e revoando salta
E sobre a densa relva a si mesmo exalta;
Que no chão permanece exposto molemente
E no lodo chafurda a luta eternamente.

- O SENHOR

Não tens mais coisa alguma agora a me dizer?
Surges sempre com queixas tantas a fazer?
No mundo nada há justo, exato, nem perfeito?

- MEFISTÓFELES
Não, Senhor! Tudo ali está muito mal feito,
E a pobre Humanidade em perene sofrer,
Que eu gostaria até de não n’a aborrecer.


Fausto - Goethe.

Blasfêmia!

- Criado:
Fui testemunha, à noite passada, de certas coisas...

- Marquês:
Estava observando?
Sente-se.
Sente-se e coma, não se emburre como uma criança.
Lhe acreditava adulto.

- Criado:
Nem adulto nem nada.
Foi uma blasfêmia!
Foi um crime!

- Marquês:
A blasfêmia e o crime... lhe incomodam?
O que é você, criado?
Nisso teremos que mudá-lo.
Há Há Há Há Há!
Sente-se!
do que viu à noite, que nos comportávamos como seres livres, que desprezávamos a falsa moral em nome do prazer?
Por sermos imaginativos, por nos rebelarmos, por isso protesta?

- Criado:
Vai contra a natureza.
Contra Deus e a religião.

- Marquês:
Espere... vamos por partes.
O que nos dá a Natureza?
Não é voraz, destrutiva, cruel, traidora e totalmente insensível?
Por acaso matar e mutilar não é o que melhor se lhe dá?
Não vê que o mal é seu elemento natural, que emprega sua força criadora para encher o mundo de sangue, lágrimas e dor?

- Criado:
É nossa mãe.


- Marquês:
Que mãe dedica suas forças para causar desastres, a assassinar sem beneficiar a seus próprios filhos?
Olhe bem para essa sua "mãe" e a verá criar com a única finalidade de destruir.
Tudo o que faz é matar!
Ela nos obriga, a seus filhos, a nos comportarmos melhor?
Mataria uma mãe como essa?
Enquanto Deus...
A Natureza não depende de nossa vontade ou desejo.
Mas Deus é um engenheiro de temores e ansiedades humanas.
As pessoas sempre foram desgraçadas, sempre tiveram medo.
Busca-se a causa do sofrimento na esperança de que termine.
Inventa-se um Deus mítico para que cumpra seus desejos.
Deus não é mais que uma fantasia.
Nasceu de nosso medo.

- Criado:
Mas a religião nos ensina...

Marquês:
O que nos diz o dogma desse onipotente Deus?
O que pode dizer a sua religião dele?
Só o vejo como um ser bárbaro e vaidoso que um dia cria o mundo para lamentá-lo no dia seguinte.
Frágil criatura, incapaz de impor sua vontade aos homens!

- Criado:
Se Deus nos fizesse perfeitos, quem necessitaria da salvação?

- Marquês:
Que banal! Por que devemos ser dignos de nosso Deus?
Nos criar incapazes de fazer mal seria um ato digno de Deus.
Dar ao homem o livre arbítrio significa provocá-lo.
Em sua infinita sabedoria, Deus poderia vislumbrar o resultado.
Mas não, engana a sua criatura para divertir-se.
Que Deus mais terrível!
Que monstro!
Malvado Deus que não merece senão ódio e vingança!

- Criado:
Não teme a ira de Deus?
Seu castigo?
Deus nunca perdoará semelhante blasfêmia.
Não é você um monstro que viola inocentes indefensos...?

- Marquês:
Há Há! Há Há Há!
Inocentes indefensos!
Que piada insignificante! – Diz o marquês fingindo estar engasgado.

- Criado:
Lhe adverti...
Não deveria olhar.
Não deveria escutar.
Deus me perdoe por ter escutado tamanho sacrilégio.
Pai nosso que estais no céu,
bendito seja teu nome...



-Lunacy, Jan Svankmajer.

sexta-feira, julho 3

Viscus

Bom, criei o blog.
Coloquei 2 textos pra testar e vou tentar colocar algo pelo menos toda sexta-feira.

Bang blá bang.

E mais um passou...

Plac! Plac! Plac!

Ai está o preço do seu orgulho.
Estampado em seu sorriso amarelo.
Passou a vida brincando com monstros e o que esperava encontrar?
Ambição, sangue e tortura.
O medo, a respiração ofegante e o nervosismo podem inspirar um artista.

[Vou te contar uma pequena historia...]

Era um dia nublado, meus pais saíram para fazer as compras do mês e me abandonaram em casa.
Me lembro desse dia como se fosse hoje, eu era uma criança muito perturbada e estava com medo, espíritos, vozes e o medo de mim mesmo me deixava cada vez mais preocupado.
Tinha 11 anos de idade e estava no andar de baixo da minha casa assistindo meu desenho favorito quando ouvi um barulho no andar de cima, quase me caguei e vou ser sincero, eu não sei o que me deu para subir lá.
Cada degrau era uma tortura, minhas pernas pesavam toneladas e o suor escorria pelo meu rosto. Enfim cheguei ao ultimo degrau, escutei uma bola batendo contra o chão no quarto ao lado, fui andando lentamente, a dor de barriga me castigava e não conseguia conter o movimento involuntario do meu corpo, a medida que me aproximava do quarto o barulho da bola batendo contra o chão aumentava juntamente com o ritmo das batidas e aquilo foi me deixando maluco, tudo rodava, o suor escorria e tudo que eu podia fazer era tentar enfrentar meu medo.
Quando cheguei à porta do quarto o barulho era ensurdecedor, era como se a bola batesse no chão 10 vezes por segundo e o som ecoava em minha cabeça. Tudo estava apagado e fiquei cerca de 15 minutos tomando coragem para abrir a porta até que o barulho foi diminuindo e lentamente abri a porta.
Lá estava meu irmão mais novo, seu sorriso inocente e cativante, uma criança realmente adorável. Ele jogou a bola pra mim e passou correndo.
Sentei no chão e acordei com meus pais jogando água no meu rosto.

[Chega de historia]

Contei isso por um simples motivo, eu era uma criança quando meu irmão me passou a bola, já sentiu a responsabilidade quando alguém passa a bola pra você?
Hoje resolvi conversar com o espelho e adoro quando o espelho me escuta, quando olho meu reflexo vejo meu irmão que matei aos 10 anos por ciúmes e amor aos meus pais, vejo os sonhos das pessoas que já destruí e os corações que parti.
Vejo toda a ambição, toda a clareza e toda a confusão que sou, que somos.



Hoje meu caro espelho, eu sou apenas um reflexo seu.

Silêncio.

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Tão simples,
Acabei me perdendo no silêncio.
Meu reflexo numa lágrima que havia escorrido.
Sufocado por um simples olhar,
Não se aceita mais o gesto,
Abriu-lhe a porta,
Sua mente estava vazia
Enfim,
Viu-se o motivo da total perda.
Logo ao fundo
Um rio de desejos,
Desilusões, injustiça
Terminavam nas cachoeiras que escorriam dos seus olhos.
Sentir, pensar, olhar.
Proibido de viver,
Forçado a esperar
Esperar por algo improvável.
Desejos indesejáveis.
Já não havia um homem,
Já não se via ninguém.


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